O que diz a Medida Provisória 936 de 01 de abril de 2020

A situação em nosso país se agrava a cada dia em razão do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e de emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19), decretada pelo Ministro de Estado da Saúde, em 3 de fevereiro de 2020, nos termos do disposto na Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020.

Visando minimizar os impactos econômicos da crise gerada pelo coronavírus, em data de 01 de abril de 2020 foi editada nova Medida Provisória de número 936, tendo esta instituído o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, o qual traz medidas trabalhistas complementares que ajudarão a população no enfrentamento da situação crítica que estamos vivendo.  

A MP 936/2020 aponta logo no início, mais especificamente no artigo 2º, que os seus principais objetivos são a preservação do emprego e da renda; a garantia da continuidade das atividades laborais e empresariais; a redução do impacto social decorrente das consequências do estado de calamidade pública e de emergência de saúde pública. Para isso criou 3 (três) medidas que passam a vigorar imediatamente, quais sejam:

I – Pagamento de Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda;

II – Redução proporcional de jornada de trabalho e de salários;

III – Suspensão temporária do contrato de trabalho.

Tais medidas se aplicam a todos os contratos de trabalho que estão vigentes, inclusive para os de aprendizagem e de jornada parcial. Todavia, importante destacar que o parágrafo único do artigo 3º da MP 936/2020 é bem claro ao afirmar que tais medidas não se aplicam aos órgãos da administração pública direta e indireta, às empresas públicas e sociedades de economia mista, ainda que subsidiárias e aos organismos internacionais, tanto no âmbito federal, quanto nos estaduais e municipais.

Para que este programa seja realmente efetivo, o Ministério da Economia, o qual é o responsável por sua coordenação, execução, monitoramento e avaliação, provavelmente editará normas complementares necessárias à sua execução muito em breve. Isto será extremamente necessário para que os empregadores sejam orientados de como e por onde devem proceder com os cadastros, habilitações e requerimentos devidos para o registro de seus empregados no mencionado programa.

Passemos agora para a análise de cada medida individualmente:

I – Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda

  • Será custeado com os recursos da União, devendo ser operacionalizado e pago pelo Ministério da Economia;
  • Deverá ser pago em dois casos: quando houver redução proporcional de jornada de trabalho e de salário ou suspensão temporária do contrato de trabalho.
  •  Este benefício será pago mensalmente e será devido a partir da data do início da redução da jornada de trabalho e de salário ou da suspensão temporária do contrato de trabalho, sendo devido somente enquanto perdurarem estas condições. 
  • Caberá ao empregador informar a existência de alguma destas condições ao Ministério da Economia no prazo de até 10 (dez) dias contados da data em que foi celebrado o acordo que instituiu tais alterações no contrato de trabalho. Cumprida esta determinação, o pagamento da primeira parcela será realizado no prazo de 30 (trinta) dias.
  • Se o empregador não cumprir o prazo de 10 (dez) dias para informar o Ministério da Economia, ficará a seu encargo o pagamento da remuneração do empregado, até que a informação seja prestada. Nestes casos, o pagamento será em 30 (trinta) dias da data em que o Ministério da Economia tomou ciência da informação.
  • Poderá receber tal benefício qualquer empregado, independentemente do cumprimento de qualquer período aquisitivo ou de tempo de vínculo de emprego ou ainda do número de salários recebidos, com exceção dos empregados que estejam ocupando cargo ou emprego público, cargo em comissão de livre nomeação e exoneração ou seja titular de mandado eletivo.
  • Também não terá direito a este benefício aqueles que já estiverem recebendo o seguro-desemprego, os que recebem algum benefício previdenciário ou os que possuem bolsa de qualificação profissional.
  • Para aqueles trabalhadores que possuem mais de um vínculo formal de emprego na modalidade de contrato intermitente será possível receber cumulativamente um benefício emergencial para cada vínculo, todavia, a soma destes não pode ultrapassar o valor de R$ 600,00.
  • O trabalhador que for dispensado do trabalho e tiver recebido o benefício emergencial terá direito normalmente ao percebimento das parcelas do seguro-desemprego.
  • O valor do benefício terá como base de cálculo o valor mensal do seguro-desemprego a que empregado teria direito, observada as seguintes condições:
  • Redução de jornada de trabalho e salário – será calculado aplicando-se sobre a base de cálculo o percentual da redução.
  • Suspensão temporária do contrato de trabalho:
  • 100% (cem por cento) do valor do seguro-desemprego que o empregado teria direito pelo período máximo de 60 dias.
  • 70% (setenta por cento) do valor do seguro-desemprego que o empregado teria direito pelo período máximo de 60 dias – essa é a  única opção para as empresas que tiveram a receita bruta superior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais) no ano de 2019, sendo que somente poderão suspender o contrato de trabalho de seus empregados mediante pagamento de ajuda de custo mensal no valor de 30% (trinta por cento) do valor de seu salário.

* Essa é a tabela utilizada para o cálculo do seguro-desemprego:

Faixas de Salário MédioMédia SalarialForma de Cálculo
AtéR$ 1.599,61Multiplica-se salário médio por 0.8 = (80%).
De
Até
R$ 1.599,62
R$ 2.666,29
A média salarial que exceder a R$ 1.599,61 multiplica-se por 0,5 (50%) e soma-se a R$ 1.279,69.
Acima deR$ 2.666,29O valor da parcela será de R$ 1.813,03, invariavelmente.

II – Da redução proporcional de jornada de trabalho e de salário

  • Poderá o empregador firmar um acordo com o seu empregado para reduzir proporcionalmente a jornada de trabalho e o salário pelo prazo de até 90 (noventa) dias.
  • O valor do salário-hora de trabalho deverá ser preservado, não podendo sofrer redução.
  • O acordo poderá ser feito individualmente por escrito entre o empregador e o empregado, devendo ser encaminhado ao empregado com antecedência de pelo menos dois dias corridos, para aqueles que recebam salário igual ou inferior a R$ 3.135,00 (três mil cento e trinta e cinco reais) ou para aqueles que possuem diploma de nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Para os empregados que recebem salário entre R$ 3.136,00 (três mil cento e trinta e seis reais)  e R$ 12.202,12 (doze mil, duzentos e dois reais e doze centavos) somente será  permitido o acordo individual para a redução da jornada e de salário de 25% (vinte e cinco), sendo que nas demais situações é indispensável que a alteração seja  estabelecida por convenção ou acordo coletivo junto aos sindicatos.
  • A jornada de trabalho e de salário somente poderá ser reduzida nos seguintes percentuais: 25% (cinte e cinco por cento); 50% (cinquenta por cento); 70% (setenta por cento).
  • O trabalhador deverá voltar a trabalhar em sua jornada normal e receber seu salário integral no prazo de 02 (dois) dias contados do término do estado de calamidade pública ou da data estabelecida no acordo individual ou coletivo ou ainda da data em que for comunicado pelo empregador quando este tomou a decisão de antecipar o  fim do período de redução pactuado.  

III – Da suspensão temporária do contrato de trabalho

  • O empregador poderá suspender o contrato de trabalho de seus empregados pelo prazo máximo de 60 (sessenta) dias, podendo fazer isso de forma contínua ou dividindo em 02 (dois) períodos de 30 (trinta) dias cada.
  • O acordo poderá ser feito individualmente por escrito entre o empregador e o empregado, devendo ser encaminhado ao empregado com antecedência de pelo menos dois dias corridos, para aqueles que recebam salário igual ou inferior a R$ 3.135,00 (três mil cento e trinta e cinco reais) ou para aqueles que possuem diploma de nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Para os empregados que recebem salário entre R$ 3.136,00 (três mil cento e trinta e seis reais) e R$ 12.202,12 (doze mil, duzentos e dois reais e doze centavos) é indispensável que a suspensão seja  estabelecida por convenção ou acordo coletivo junto aos sindicatos.
  • Enquanto o contrato de trabalho estiver suspenso o empregado terá direito a receber todos os benefícios concedidos pelo empregador.
  • O empregado poderá, ainda, fazer o recolhimento para o Regime Geral de Previdência Social na qualidade de segurado facultativo.
  • O trabalhador deverá voltar ao trabalhado no prazo de 02 (dois) dias contados do término do estado de calamidade pública ou da data estabelecida no acordo individual ou coletivo ou ainda da data em que for comunicado pelo empregador quando este tomou a decisão de antecipar o fim do período de redução pactuado. 
  • Para as empresas que tiveram a receita bruta superior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais) no ano de 2019, somente poderão suspender o contrato de trabalho de seus empregados mediante pagamento de ajuda de custo mensal no valor de 30% (trinta por cento) do valor de seu salário.
  • É expressamente proibido que durante a suspensão do contrato de trabalho o empregado mantenha atividades de trabalho, ainda que parcialmente, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou à distância. Caso isso ocorra, o empregador deverá pagar imediatamente a remuneração e os encargos sociais devidos referente a todo o período.

A MP 936/2020 também prevê que o empregador poderá, ainda, satisfazer o pagamento de ajuda compensatória mensal ao empregado que tiver sua jornada de trabalho e seu salário reduzido ou ainda o seu contrato suspenso, devendo este valor ser definido por acordo individual ou negociação coletiva, sem prejuízo do recebimento pelo empregado do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda. Nestes casos, a ajuda compensatória terá natureza indenizatória, razão pela qual não integrará a base de cálculo do imposto de renda retido na fonte, a declaração de ajuste anual do imposto sobre a renda da pessoa física do empregado, da contribuição previdenciária, tão pouco deverá ser recolhido FGTS sobre tal valor.

É importante também se atentar ao prazo máximo para a suspensão do contrato de trabalho e para a redução da jornada de trabalho e do salário, que somados não podem ultrapassam o limite de 90 (noventa) dias.

Outro ponto muito interessante é a previsão de garantia provisória no emprego dos empregados que receberem o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda. Assim, o empregado não pode ser dispensado durante o período acordado de redução da jornada de trabalho e de salário ou de suspensão do contrato de trabalho.  E ainda, quando do restabelecimento das condições normais de trabalho, o empregado terá estabilidade pelo período equivalente ao acordado para a redução ou suspensão do contrato, não podendo ser dispensado sem justo motivo.

Uma vez que o empregador não respeite a garantia provisória mencionada acima e dispense o empregado sem justa causa, deverá pagar ao trabalhador uma indenização nos seguintes moldes:

  • 50% (cinquenta por cento) do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória, quando a redução de jornada e de salário for igual ou superior a 25% (vinte e cinco por cento) e inferior a 50% (cinquenta por cento);
  • 75% (setenta e cinco por cento) do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória, quando a redução de jornada e de salário for igual ou superior a 50% (cinquenta por cento) e inferior a 70% (setenta por cento);
  • 100% (cem por cento) do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória, quando a redução de jornada e de salário for superior a 70% (setenta por cento) ou quando o seu contrato tiver sido suspenso;

Todavia, se o empregado fizer o pedido de demissão ou a dispensa se der por justa causa, nada é devido ao trabalhador a título de indenização.

A MP 936/2020 autoriza, ainda, que as convenções e os acordos coletivos de trabalho estabeleçam percentuais de redução de jornada e de salário diversos dos que constam em seu texto, ou seja, diversos de 25%, 50% e 70%. Em tais casos, o cálculo para o pagamento do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda deverá ser feito da seguinte maneira:

  • Redução inferior a 25% (vinte e cinco por cento) – não será devido o benefício;
  • Redução igual ou superior a 25% (vinte e cinco por cento) e inferior 50% (cinquenta por cento) – 25% do valor mensal do seguro-desemprego a que empregado teria direito;
  • Redução igual ou superior a 50% (cinquenta por cento) e inferior a 70% (setenta por cento) – 50% do valor mensal do seguro-desemprego a que empregado teria direito;
  • Redução superior a 70% (setenta por cento) – 70% do valor mensal do seguro-desemprego a que empregado teria direito;

E ainda, uma vez que o empregador opte por celebrar o acordo individual com seu empregado, ainda assim, terá o prazo de 10 (dez) dias para comunicar os Sindicatos quanto ao conteúdo de tal acordo.

Ademais, as convenções ou os acordos coletivos de trabalho celebrados anteriormente à edição da MP 936/2020 poderão ser renegociados para adequação de seus termos, até o dia 10 (dez) de abril de 2020.

Por fim, tendo em vista a determinação da importância do isolamento social para que seja possível conter a contaminação em massa da população pelo coronavírus, está expressamente autorizada pela MP 936/2020 a utilização dos meios eletrônicos para atendimento de requisitos formais, como por exemplo para a convocação, deliberação, decisão, formalização e publicidade de convenção ou de acordo coletivo de trabalho.

É importante ficarmos atentos, pois a qualquer momento podem ser editadas novas medidas para tratar sobre o tema, eis que estamos vivendo em um momento de muitas incertezas econômicas e jurídicas, em razão do estado de calamidade pública.

Patrícia Battistone Cordeiro Gonçalves
Advogada – OAB/SP 331.540

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