ECA: 31 anos e os direitos da criança e do adolescente violados na pandemia
No dia 13 de julho de 2021, foi celebrado os 31 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente. O ECA, principal instrumento normativo sobre os direitos da criança e do adolescente no Brasil, prevê como garantias fundamentais, entre outras, a segurança alimentar, saúde, lazer, proteção social, convivência familiar e em comunidade.
Entretanto, o estatuto que foi criado para garantir, de um modo geral, o bem-estar dessa parte da população, no cenário pandêmico atual, diversas garantias foram violadas, principalmente a saúde alimentar e saúde mental dos jovens, decorrentes tanto do isolamento social, quanto da crise econômica/social que o nosso país também está enfrentando, com o aumento do desemprego e da pobreza.
Apesar das garantias previstas no ECA, no sentido de visar o crescimento e desenvolvimento da criança no Brasil, de ter uma vida digna, construída à base de respeito, afeto, boa educação e alimentação, o poder público, que já se mostrava descompromissado e negligente com a causa há anos, age com mais descaso durante a pandemia.
E os reflexos dessa negligência aprofundada na pandemia é o aumento de crianças nos sinais pedindo trocados a quem está no trânsito, tanto em razão da ausência dos pais ou de algum adulto para ficar em casa com elas, quanto a falta de comida dentro de casa. E o cenário mais preocupante é o aumento da violência familiar, dos maus tratos ao jovem, a partir do momento que o jovem está fora do seu espaço de proteção, como a escola e as assistências sociais, que permaneceram fechadas no início da pandemia.
Importante destacar que, com o isolamento social, houve um aumento considerável nos índices de violência digital, como o assédio sexual, consequência da exposição do jovem à internet por mais tempo.
Infelizmente, a realidade social atual do nosso país, somada à ausência de medidas efetivas do poder público, no sentido de aplicação do ECA, intensifica a condição de vulnerabilidade social dos jovens e, como consequência, nega a eles direitos constitucionais à integridade, ao respeito e à dignidade.
Novo Canal de Denúncia
Segundo Agência Brasil, em uma cerimônia realizada no último dia 13, pelos ministérios da Mulher, Família e Direitos Humanos (MMFDH), Cidadania e Economia, foi anunciado, entre as novas medidas voltadas à infância e adolescência, um canal de denúncias dentro da plataforma disque 100, número 101, que poderá receber reclamações de profissionais de saúde sobre violações de direitos humanos e atos de violência autopromovida, como suicídio e automutilação.
Aumento Do Trabalho Infantil Durante A Pandemia
De acordo com um novo relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o trabalho infantil aumentou pela primeira vez em duas décadas, durante a pandemia, atingindo um total de 160 milhões de crianças e adolescentes no mundo, e um aumento de 8,4 milhões, de 2016 a 2020.
Um dado preocupante é que mais da metade desse número global representa crianças de 5 a 11 anos, e que crianças e adolescentes de 5 a 17 anos se submetem a trabalhos perigosos que prejudicam sua saúde, segurança ou moral, representando 79 milhões – um aumento significante de 6,5 milhões de 2016 a 2020.
Segundo relatório, há previsão de que cerca de 8,9 milhões de crianças e adolescentes correm o risco de se submeter ao trabalho infantil até 2022, devido aos impactos da covid-19.
A estimativa para o Brasil, com a pandemia desenfreada, também é bem preocupante. Um outro levantamento realizado pela UNICEF, aponta que houve um aumento de incidência do trabalho infantil durante a pandemia em São Paulo, de abril a julho de 2020, sendo constatado que “No conjunto dos domicílios em que mora pelo menos uma criança ou um adolescente, a incidência do trabalho infantil era de 17,5 por 1.000 antes da pandemia, e passou a ser 21,2 por 1.000 depois da pandemia, um aumento de 21%.”
O Trabalho do Jovem no Brasil
E se tratando de trabalho infantil, a legislação brasileira trabalhista, em harmonia com as normas previstas no ECA, prevê alguns dos direitos e proibições com relação ao trabalho do menor, como por exemplo:
• Ao menor de 16 anos de idade é vedado qualquer trabalho, salvo na condição de aprendiz a partir de 14 anos, o qual deve ser feito por escrito e por prazo determinado (artigo 428 da CLT);
• O artigo 7º, inciso XXXIII, da Constituição Federal, considera menor o trabalhador de 16 (dezesseis) a 18 (dezoito) anos de idade;
• É proibido o trabalho do menor de 18 anos em condições perigosas ou insalubres. Os trabalhos técnicos ou administrativos serão permitidos, desde que realizados fora das áreas de risco à saúde e segurança;
• É devido, no mínimo, o salário mínimo federal, inclusive ao menor aprendiz é garantido o salário mínimo hora, uma vez que sua jornada de trabalho será de no máximo 6 horas diárias, ficando vedado prorrogação e compensação de jornada, podendo chegar ao limite de 8 horas diárias, desde que o aprendiz tenha completado o ensino fundamental, e se nelas forem computadas as horas destinadas à aprendizagem teórica;
• O empregador está obrigado a conceder ao menor o tempo que for necessário para a frequência às aulas;
• O empregado estudante, menor de 18 (dezoito) anos, terá direito a fazer coincidir suas férias com as férias escolares;
• Ao menor é proibido o trabalho no horário das 22:00 as 05:00;
Diante de todo esse cenário, o que se observa é a necessidade urgente de colocar em prática a afirmação contida no ECA de tornar prioridade absoluta, pelo poder público, a infância e adolescência, com o aumento de recursos e investimentos, fundamentais para garantir mais acesso à educação, alimentação, menos pobreza, mais respeito, mais afeto e dignidade, visando o desenvolvimento de toda a população.
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Stephanie Gimenes Arévalo
Advogada – OAB/SP 351.683