O acolhimento de Pessoas Transexuais no ambiente de trabalho

Por mais que nos últimos anos a luta contra a intolerância de gênero tenha tido grandes avanços, nossa sociedade continua semeando discursos de ódio e adotando posturas nitidamente preconceituosas. Resultado direto da perpetuação do preconceito é a baixa inserção de pessoas transexuais no mercado de trabalho. Segundo pesquisa realizada pela ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) apenas 10% desta população tem acesso a empregos formais.

Embora a parcela de pessoas transexuais inseridas em trabalhos “formais” seja baixíssima, mesmo nos ambientes em que houve a contratação, situações intoleráveis podem acontecer em decorrência do preconceito. Contudo, sabe-se que é papel do empregador manter uma boa relação entre seus colaboradores, possuindo a obrigação de zelar pelo bem-estar e pela dignidade do ser humano no exercício laboral.

O processo de contratação da população transsexual é tarefa que se reveste de grande responsabilidade, na qual os colaboradores devem adotar postura estritamente profissional, abandonando seus preconceitos e juízos de valor. Neste sentido, existem soluções viáveis e práticas que podem evitar desconforto e episódios de intolerância, resultando em uma mais longa manutenção das pessoas trans no emprego.

Tratamento pelo pronome de identificação

Antes de qualquer pontuação, é importante conceituar quem são as pessoas transexuais. Em poucas linhas e de forma totalmente simplista, deve-se ter a ideia de que pessoas transexuais são aquelas que se identificam com o gênero oposto ao atribuído ao seu sexo biológico, ou seja, se uma pessoa nasce detentora de órgãos sexuais do sexo masculino, mas não se sente como um homem, ela é uma mulher transexual. Geralmente, o sentimento é de que seu corpo não é condizente com a forma como se identificam, podendo se utilizar de cirurgias para adequação do gênero, porém, esta não é uma obrigatoriedade para a caracterização própria.

Neste sentido, ao tratar uma pessoa trans, é imperioso respeitar o pronome de identificação. Isso significa que ao indivíduo não é permitido julgar o outro somente pela sua aparência física ou pelo órgão genital que possui, devendo-se perguntar qual é a forma como a pessoa transexual gostaria de ser chamada. Se um indivíduo nasceu no corpo de um homem, mas se reconhece como uma mulher, é necessário respeitar e tratar esta pessoa como ela é, em todas as falas. Este tratamento deve ser utilizado por todos os colaboradores, independentemente da posição hierárquica que ocupe na empresa.

Não limitação de funções

Uma tendência do mercado de trabalho ao contratar pessoas transexuais é a de limitar suas funções e oportunidades dentro de uma empresa, sem que haja qualquer justificativa, mas simplesmente pela questão do gênero e pela reprodução da ideia de que somente algumas categorias são “apropriadas” para elas. Ao agir dessa forma, há uma repetição do discurso de marginalização dessa população, enfraquecendo o sentimento de pertencimento e acolhimento perante a companhia.

É necessário, portanto, utilizar outros critérios para determinação de qual a função a ser ocupada. Assim como é feito com os demais funcionários, a análise do currículo, com foco na área de especialização, na área de maior domínio e a familiaridade com as atividades são fatores cruciais para a adequada alocação nas possíveis funções, afinal, o objetivo é analisar a capacitação da pessoa e não somente suas características fenotípicas.

Utilização do nome social nos documentos de identificação

O nome social, instituto reconhecido através do nº Decreto 8727/16, é a designação pela qual a pessoa travesti ou transexual se identifica e é socialmente reconhecida, ou seja, é o nome pelo qual a pessoa quer ser chamada.

Hoje, o Brasil já possui regulamentação acerca da retificação de nome no registro, contudo, não são todas as pessoas transexuais que necessariamente enfrentarão esta troca. É por isso que cabe ao empregador respeitar a identificação pessoal de cada indivíduo e, quando possível, fazer a utilização do nome social em detrimento do nome de nascença.

O Ministério Público do Trabalho (MPT), em dezembro de 2015, publicou a Portaria nº 1.036/2015, a qual versa sobre a organização interna, mas que possui grande importância para toda a sociedade. No documento é expresso que o nome social deve ser utilizado em “comunicações internas, e-mails institucionais, crachás e listas de ramais; nos nomes de usuário de sistemas de informática; e na inscrição em eventos promovidos pela instituição”. Portanto, é aconselhável que as empresas ajam da mesma forma, respeitando o nome social em todas as situações em que for possível.

Acesso aos banheiros

A utilização dos banheiros por pessoas transexuais pode ser um tema delicado, eis que ainda carece de regulamentação no direito brasileiro. O Ministério Público do Trabalho (MPT), através da já mencionada Portaria nº 1.036/2015, determina que o acesso aos banheiros e vestiários em suas unidades deve ocorrer de acordo com o nome social e com a identidade de gênero de cada pessoa.

Ao analisar a Constituição Federal, o artigo 1º, inciso III, estabelece que a dignidade da pessoa humana é um direito fundamental. Assim, ao obrigar uma pessoa transexual a utilizar o banheiro do sexo com o qual não se identifica, há uma grave violação deste direito. Portanto, o mais adequado a se fazer é permitir que a pessoa transexual possa utilizar os banheiros destinados ao gênero com o qual se identifica.

Ficou com alguma dúvida? O escritório de advocacia Cordeiro & Gonçalves está à disposição para esclarecimentos!

Ricardo Jordão Santos
Advogado – OAB/SP 454.451

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